Jornalista/Radialista
BUENOS AIRES - "Câmbio, câmbio." "Dólar, euro, real." "Câmbio, câmbio." Por toda a rua Florida, famoso corredor de lojas no centro de Buenos Aires, dezenas de cambistas atraem turistas e argentinos para trocar moedas estrangeiras pela cotação do "blue", referência para o câmbio paralelo na Argentina.
Superam 20 os cambistas em cada um dos dez quarteirões da rua. Aos clientes, mostram a cotação do dia na calculadora do celular e os encaminham para dentro de bancas de flores ou outros produtos, algumas só fachadas das chamadas "cuevas", onde máquinas rodam sem parar contando dinheiro.
As "cuevas" da Florida e de outros cantos da cidade têm de armazenar pilhas de cédulas. A maior em circulação na Argentina é a nota alaranjada de 1.000 pesos. Trocando US$ 100, sai-se dali com 39 notas de 1.000 pesos, o dobro de um ano atrás. Com R$ 100, tem-se quase 7.500 pesos.
O valor não dura muito. Como dizem os argentinos, com a inflação anual em três dígitos, gastar rápido é a melhor maneira de "poupar" pesos que "queimam na mão".
No ano passado, o consumo privado na Argentina aumentou 9,4% em relação a 2021 sustentando um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 5,2%. No setor de hotéis e restaurantes, puxado por turistas que surfam no câmbio favorável, o salto foi de 35%.
Nesse ambiente, abstraindo-se os apelos dos cambistas, algumas lojas fechadas ou decadentes e muitos sem-teto pelas ruas da cidade, tem-se a sensação de uma Buenos Aires vibrante, com gente consumindo e se divertindo em cafés e restaurantes, no centro e zonas como Recoleta e Palermo.
Mas, como as fachadas atraentes das "cuevas" na Florida, essa superfície efervescente oculta uma rápida deterioração econômica em curso neste ano de eleições presidenciais, o que tem levado o governo a tomar medidas heterodoxas e extremas sem atacar problemas estruturais que amarram a economia há décadas.
"A pergunta de curto prazo é se a bomba explode antes das eleições, em outubro, ou da mudança de governo, em dezembro", afirma Miguel Broda, um dos mais conceituados economistas argentinos.
A Argentina completou em março 40 anos ininterruptos sob regime democrático, período mais longo da história. Nesse tempo, atravessou nove grandes crises, algumas com anos de duração, e conserva hoje o mesmo PIB per capita também de 40 anos atrás. Em média, o país cresceu só 1% ao ano no período.
O fundamental é o fato de que, em mais de um século, a Argentina fechou as contas públicas no azul em apenas dez ocasiões.
Nos últimos anos, sem credibilidade no mercado para se financiar só vendendo títulos públicos, o país passou simplesmente a imprimir pesos. A ponto de precisar contratar casas da moeda no Brasil e na Espanha e levar os bancos a ampliar áreas de armazenamento de notas e adquirir novos cofres.
Agora, com uma forte crise à espreita, de superinflação em aceleração, o governo de Alberto Fernández e Cristina Kirchner reluta em adotar medidas impopulares e urgentes.
Embora Fernández pareça carta fora do baralho, Cristina pode querer se candidatar a presidente e desafiar as chances do atual ministro da Fazenda, Sergio Massa, da Frente de Todos, coalizão que governa a Argentina desde 2019.
No campo adversário da direita liberal há o atual prefeito de Buenos Aires, Horacio Larreta, e Patricia Bullrich, ex-ministra da Segurança, ambos do Juntos por el Cambio. Na direita radical, o deputado Javier Milei.
Até outubro, quando o pleito se realiza, há o risco de a inflação, e as contas públicas, entrarem em novo ciclo de deterioração.
Nos últimos 12 meses até fevereiro, os preços subiram 102,5%, a maior taxa desde 1991. Somou-se a isso a maior seca no país em 60 anos, que deve reduzir em até US$ 25 bilhões as exportações da safra 2022-2023, numa queda de 48% em relação ao ciclo anterior.
"É uma perda que levará a economia inteira a sofrer, pois a agropecuária é quem mais gera dólares. Haverá sangria em vários setores e nas contas públicas", diz Nicolás Pino, presidente da Sociedade Rural Argentina.
Algumas consultorias preveem queda de 3% no PIB neste ano, e dados oficiais do último trimestre de 2022 mostraram desaceleração de -1,5% em relação ao trimestre anterior.
Com menos dólares entrando, aumenta a pressão sobre o câmbio e a inflação, num país em que economistas estimam que as reservas internacionais estejam negativas.
Isso estrangula a capacidade do governo de financiar de forma minimamente sustentável políticas sociais para atenuar a atual crise, e que consomem grande parte do Orçamento.
Na semana passada, o governo tomou duas medidas heterodoxas conjuntas para tentar aliviar pressões sobre a inflação e o caixa.
Por um lado, determinou às empresas estatais vender ou trocar títulos em dólares por novos papéis denominados em pesos, injetando cerca de US$ 4 bilhões nas reservas do Banco Central, que interveio pesado no câmbio para tentar conter a inflação. Por outro, imprimiu mais 130 bilhões de pesos para honrar pagamentos, sobretudo de benefícios sociais.
Segundo dados do Observatório da Dívida Social da Universidade Católica Argentina (UCA) e do Indec (o IBGE argentino), 43,1% dos argentinos (19,8 milhões) estão abaixo da linha de pobreza, o que leva o país a despejar enormes subsídios às famílias, de contas de luz e gás a transferências de dinheiro que, direta ou indiretamente (via deduções de imposto), chegam a 95% das crianças e jovens com menos de 17 anos.
Para financiar essas políticas, a taxação do governo argentino sobre a produção agropecuária (maior fonte de dólares) está entre as mais altas do mundo, e há imposto sobre exportações com alíquotas de até 35%.
Outros setores produtivos também vêm sendo mais taxados para financiar a mitigação da pobreza, mas sem que haja mudanças para racionalizar a complexa rede de subsídios e o Estado.
Segundo Gala Díaz Langou, diretora-executiva do Cippec, centro de políticas públicas apartidário de Buenos Aires, os subsídios em 2022, sobretudo para a energia, representaram 82% do déficit fiscal.
"No ano passado, o Estado pagou 79% do custo da luz e 71% do gás a todos os conectados à rede. Muitos estão nas camadas mais favorecidas, o que significa que pagamos pela climatização das piscinas dos ricos", afirma.
Os subsídios estatais em energia e transportes (a gasolina custa menos da metade da brasileira, pelo câmbio paralelo) consomem quase o dobro das despesas em saúde e quase um terço a mais que a educação.
Eles aumentaram a partir de 2001, quando o peso sofreu maxidesvalorização ao fim de um período de paridade da moeda com o dólar, levando ao "corralito" (confisco) de depósitos bancários. Na época, metade dos argentinos caiu na pobreza.
Durante o governo Macri, alguns tarifaços diminuíram os subsídios, mas eles retornaram no governo Fernández e Cristina, com a pandemia e a Guerra da Ucrânia.
Depois de atingir 2,4% do PIB em 2022, o déficit primário (sem contar juros da dívida pública) previsto para 2023 é de 1,9%, segundo acordo com o Fundo Monetário Internacional, credor de US$ 44,5 bilhões. Mas, com a seca histórica e o desaquecimento em curso, a meta parece impossível.
Mesmo um plano para subsidiar menos a energia de quem ganha mais resolveria só parte do déficit, pois há outras questões fundamentais.
Nos últimos dez anos, o funcionalismo nas três esferas de governo aumentou de 2,7 milhões para 3,4 milhões (17,4 pontos percentuais acima do aumento populacional), segundo o Instituto Argentino de Análise Fiscal. O país tem 50% mais servidores em relação à sua população do que o Brasil.
Além dos subsídios à energia, outros programas sociais representam mais de 10% do Orçamento e, segundo o observatório da UCA, chegam a 45% da população.
Por fim, o sistema previdenciário argentino é altamente deficitário, com a maioria (55%) dos 9 milhões de aposentados não tendo contribuído, segundo o Idesa (Instituto de Desenvolvimento Social Argentino). Só 23% dos benefícios foram concedidos com a totalidade dos aportes.
Durante muitos anos, também foram aprovadas milhares de aposentadorias especiais, que pagam mais e contemplaram de militares e medalhistas olímpicos a cantores do teatro Colón.
Com as eleições se aproximando, é praticamente nula a discussão sobre esses temas difíceis entre as possíveis candidaturas. Mas Buenos Aires segue vibrante.
por FERNANDO CANZIAN / FOLHA de S.PAULO
FRANÇA - Grupos vestidos de preto atearam fogo em latas de lixo e atiraram projéteis contra policiais em Paris, que responderam com gás lacrimogêneo, à margem de uma marcha contra o presidente francês, Emmanuel Macron, e seu projeto de lei altamente impopular para as aposentadorias.
Os confrontos também eclodiram em manifestações semelhantes em cidades como Rennes, Bordeaux e Toulouse, com uma agência bancária e carros sendo incendiados em Nantes.
No entanto, embora a frustração pública tenha evoluído para um sentimento anti-Macron mais amplo, o nível de violência nesta terça-feira não chegou nem perto do visto na semana passada e os protestos foram, em sua maioria, pacíficos.
No início do dia, o governo rejeitou uma nova demanda dos sindicatos para suspender e repensar o projeto de reforma, que atrasará a idade de aposentadoria em dois anos, para 64 anos, enfurecendo líderes trabalhistas que disseram que o governo tem de encontrar uma saída para a crise.
O governo disse que está mais do que disposto a conversar com os sindicatos, mas sobre outros assuntos, e repetiu que se manterá firme na questão previdenciária.
Milhões de pessoas têm se manifestado e se juntado à greve desde meados de janeiro para mostrar sua oposição ao projeto de lei.
Os protestos se intensificaram desde que o governo usou poderes especiais para aprovar a legislação no Parlamento sem uma votação.
A polícia disse que 93.000 pessoas marcharam em Paris na terça-feira, número menor do que o recorde de 119.000 pessoas na manifestação de 23 de março, mas maior ou igual às manifestações anteriores desde janeiro.
Um manifestante em Paris capturou o clima, brandindo uma faixa que dizia: "A França está com raiva".
"O projeto de lei (de aposentadoria) tem atuado como um catalisador para a raiva com as políticas de Macron", disse Fanny Charier, de 31 anos, que trabalha para a agência governamental francesa de empregos Pôle emploi.
Macron, que prometeu entregar a reforma previdenciária em ambas as suas campanhas presidenciais, diz que a mudança é necessária para manter as finanças do país em equilíbrio. Sindicatos e partidos de oposição dizem que há outras maneiras de fazer isso.
"Propusemos uma saída... e é intolerável que estejamos sendo obstruídos novamente", disse o chefe da central sindical CFDT, Laurent Berger, a repórteres no início de uma manifestação em Paris.
Reportagem de Tassilo Hummel, Stephane Mahe, Antony Paone, Bertrand Boucey, Eric Gaillard, Elizabeth Pineau, Marc Leras, Forrest Crellin, Jean-Michel Belot / REUTERS
RIO DE JANEIRO/RJ - O Grupo Petrópolis, dono das marcas Itaipava, Crystal, Black Princess e Petra, entre outras, entrou na última segunda-feira, 28, com pedido de recuperação judicial na Justiça do Rio de Janeiro. As dívidas da companhia somam na ordem de R$ 4,4 R$ 4 bilhões. O pedido foi apresentado em regime de urgência, uma vez que a empresa tenta evitar “os gravosos e nefastos efeitos” da cobrança de uma parcela de R$ 105 milhões, referente a uma dívida financeira. “Essa parcela vence hoje, dia 27.03.2023, e seu inadimplemento provocará o vencimento antecipado das demais operações existentes com a casa bancária, resultando na pronta liquidação dos recursos travados na conta vinculada e tentativa de apropriação dos recebíveis do Grupo Petrópolis que ira o ingressar na referida conta nas próximas semanas”, dizem os advogados na petição.
De acordo com o pedido da defesa, a crise de liquidez da Cervejaria Petrópolis vem se agravando há aproximadamente 18 meses, reflexo da “drástica redução” da receito e da queda das vendas. Em 2020, segundo a empresa, foram vendidos 31,2 milhões de hectolitros da bebida, volume reduzido para 26,4 e 24,1 milhões nos anos de 2021 e 2022, respectivamente. “Essa redução no volume de vendas resultou numa queda de 17% da receita bruta do grupo no mesmo período”, continua a petição. Nesta terça-feira, 28, a 5ª Vara Empresarial da cidade do Rio de Janeiro concedeu uma medida cautelar ao Grupo Petrópolis e determinou a liberação dos recursos da empresa, como forma de antecipar os efeitos da recuperação judicial.
BRASÍLIA/DF - O governo federal prorrogou até 3 de maio o prazo de recadastramento de armas no Sistema Nacional de Armas (Sinarm). O decreto foi publicado nesta quarta-feira (29) no Diário Oficial da União. O prazo começou em 1º de fevereiro e iria até 30 de março.
Em nota técnica, a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, justificou que a prorrogação do prazo tem o propósito de assegurar “melhor adequação da Polícia Federal no cumprimento da atividade de recadastramento atribuída ao órgão policial”, considerando as dimensões continentais do país.
O Sinarm, da Polícia Federal (PF), é o sistema de registro de armas de uso permitido de civis que concentra dados de armas mantidas por empresas de segurança privada, policiais civis, guardas municipais e pessoas físicas com autorização de posse ou porte. Já Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), do Exército, registra as armas de uso restrito pertencentes a colecionadores, atiradores e caçadores (CAC’s).
Com o recadastramento, todas as armas de uso permitido e de uso restrito devem ser cadastradas no Sinarm, ainda que já registradas em outros sistemas.
Ontem (28), em audiência pública na Câmara dos Deputados, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, afirmou que o processo tem sido tão bem sucedido que o número de armas recadastradas já é maior do que o de armas originalmente cadastradas nos sistemas oficiais.
Dino não chegou a apresentar novos números, mas no último balanço, da semana passada, 81% das 762.365 armas de CACs, registradas no Sigma, haviam sido recadastradas na Polícia Federal. As mais de 613 mil armas recadastradas superam a meta do governo, que era chegar a 80% de recadastramentos feitos.
Os proprietários que não desejarem mais manter a propriedade de armas poderão entregá-las em um dos postos de coleta da Campanha do Desarmamento, autorizados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Outra mudança trazida no decreto de hoje permite que o diretor-geral da PF estabeleça procedimentos especiais para a apresentação de armamentos, motivados por questões de logística e segurança. O novo texto prevê a possibilidade da exposição às equipes da PF em local distinto das respectivas delegacias.
O recadastramento foi uma determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que suspendeu, por meio de decreto, os registros para aquisição e transferência de armas e de munições de uso restrito por CACs. Após o fim dessa etapa, uma proposta de novo decreto com regras sobre aquisição de armas, obtenção de posse ou porte e funcionamento de clubes de tiro será apresentado pelo governo.
Ao determinar a suspensão, Lula criou grupo de trabalho para tratar dessa nova regulamentação ao Estatuto do Desarmamento.
O decreto desta quarta-feira também muda a composição do grupo de trabalho, que passará a contar com dois novos integrantes: uma representação da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados e uma representação da Comissão de Segurança Pública do Senado Federal. A participação no grupo foi solicitada pelos interessados ao ministro Flávio Dino.
Por Andreia Verdélio – Repórter da Agência Brasil
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